17 maio 2011

do meu direito de ouvir

Ela ficava lá falando. Nunca vi ninguém com tanta coisa pra dizer. E enquanto falava balançava a pele pendente abaixo do queixo. Os cabelos de aspecto velho, gasto, o nariz redondo vermelho, as roupas estranhas - nada incomodava mais no quadro daquela mulher do que ouvi-la falando. As frases sempre no mesmo tom, discorrendo sobre acertos e erros, repetindo tudo outra vez de novo. E as piadas nem eram engraçadas. Será que ela não se dava conta? Será que ninguém se dava conta? Ah, meu Deus. Era muito chato. Ficar ouvindo. E ela falando. A cara de eu já sei tudo. Ouvir é coisa boa. Ouvir é coisa boa por excelência. E naqueles casos. Tornava-se extenuantemente maçante. Era injusto que ela estragasse. Aquela mulher que parecia ter nascido para infortunar.
Uma bola de pêlos. Enfiei uma bola de pêlos na boca dela. E ela se calou. E eu pude voltar a ouvir.

Um comentário:

  1. Primeira leitura:
    Primeiro li o tema. Dai comecei o texto. Fiquei procurando a bola de pêlos.

    Segunda leitura: sabe aquelas coisas que tu lê e diz "é isso"? Não num tom pejorativo, mas de uma coisa que por si só é completa? Que se fecha e fica perfeita do jeito que está. Redondinho. Então, é isso. Adorei.

    ResponderExcluir