20 abril 2011

Minha Casa

Fora, as pessoas se perguntam: "— Aqueles vultos que vemos, são os móveis da casa?" Não acreditam na idéia de haver uma casa onde não haja móveis. Com suposições confusas, definem que os vultos que vêem, é todo o tipo de móvel que uma casa deve ter. No cantinho é o sofá, mais ao fundo é a cadeira. "­— Ah que graça de quadro!" Eles falam. Belo espelho, e tapetinho simpático. Outros gostam bastante dos azulejos ganhos em alguma festividade cristã. Lá dentro guarda seu guarda-roupa e sua sapateira. Também, sua mesa e sua cama. Tudo que é visto de fora não passa de vulto. Formas que parecem outras formas. As pessoas não conseguem ver não-formas. Elas têm e precisam ver formas. Definidas. Nítidas. Não surpreende saber que esse ar de mistério é explicado de maneira tão banal. Ao invés de irem atrás do que se esconde atrás das cortinas, elas se contentam em iludir-se criando falsas respostas, julgamentos precipitados.

É difícil organizar a minha casa. Os bilhetinhos de anotação estão espalhados por todos os cantos. As louças sim ficam guardadas. Afinal de contas essas ferramentas são muito uteis no dia-a-dia. Assim como a escova de dente. Manter o sorriso falso é cansativo, mas tem que estar em bom estado para funcionar. Afora isso, todo o resto é desorganizado. A parte divertida é que só eu entendo essa desorganização. Antes não passava de suposição, mas se até hoje ninguém conseguiu compreender como funciona a organização da minha casa, sem eu ter que ficar constantemente explicando, logo, tenho a certeza que essa desorganização só eu entendo. Após entrarem, e aprenderem como a organizo, é que as pessoas confortam-se como se estivessem no seu próprio lar.

Aquele breu aparente do lado de fora é triste. Elas desconhecem as paredes coloridas da minha casa. Por exemplo, no meu quarto as paredes são verdes. Verde cor de praia limpa. A sala tem as paredes bege claro e roxo. O branco não é bom porque o inquilino já é meio branco, daí ofusca os olhos e os corações. O banheiro tem uma cor que agora eu não consigo lembrar o nome. O importante que ela é sim, colorida. Gosto de saber que as pessoas de fora não captam essas tonalidades, só os que entram na minha casa. Descobrem de forma muito surpreendente que tem cores muito bonitas dentro. Diferente do que se achava. Mas nunca digo a história destas paredes. Cores, essas, que foram pintadas com o suor, sangue e lágrimas de minha vida toda.

Apenas por esse singelo motivo que, para os passantes e os velocistas, é impossível que na minha casa haja móveis e tampouco aquelas paredes colorê. Não é difícil acreditar que mesmo vizinhos próximos achem minha casa feia. Não... De forma alguma eu culpo os lixeiros, nem os carteiros. Nem os entregadores de gás ou as gatas e ratos e raposas, crianças e velhos ou serviçais. Jamais. Para eles minha casa sempre será feia. Não tenho motivos para me importar com essas opiniões. Meus amigos todos já entraram na minha casa simpática e singela. Eu sei que em suas mentes e seus corações, minha casinha sempre será aconchegante, e muito bonita. Até as cores e móveis, mesmo sendo estranhos e incongruentes, tendo uma beleza exótica, são um dos lugares do mundo em que eles gostam de estar. Isso me ruboriza e fascina.

Onde se encontra a minha casinha? Não que seja fácil encontrar, mas se quiserem saber eu digo. Na avenida do espaço, na rua do universo, condomínio liberdade, apartamento 812, caixa postal atemporal. Ela existe em um lugar de difícil acesso, que nunca é lembrado. Onde não tem crianças brincando ainda, mas um dia terá. E um dia também será tombada pela inevitável entropia. Diz ela, que tudo se quebra para ser construído novamente de forma mais forte (resistente).

Podem até não gostar, mas os inquilinos gostam. O tempo todo eles fazem festa. E sempre me incomodando. Só dão trabalho esses bobos. Apesar de que, algumas vezes, já vi um deles bem triste ouvindo Bon Jovi outro dia. Ainda assim, a parte que mais intriga é que moro sozinho. Afinal, quem, além da minha alma e dos meus sentimentos, conseguiria conviver comigo?

Minha casa é meu abrigo. Meu castelo, meu domínio. É a fronteira do infinito. Impõe-se no tempo presente. Num lugar que é bonito, até o vento, me é contente. 

Minha casa é minha vida. Minha mente.


2 comentários:

  1. Hmmm... lerei novamente. Gostei bastante do fim e me perdi um pouco no meio.

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  2. É.... ele é um pouco dificil de captar a mensagem, mas da mais uma lida sim, que tu conseguirás linkar o fim com o resto

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